Como superar a era dos extremos que atravessamos nos dias de hoje? Que desafios o mundo, o Brasil, Pernambuco e o Recife enfrentarão em 2024? Essas foram as questões norteadoras para a palestra “A Era dos Extremos Chegou. Como Atravessá-la”, do consultor e sócio fundador da TGI Consultoria, Francisco Cunha, durante a 25ª edição da Agenda TGI 2023 |Painel 2024, realizada na noite de 28 de novembro, no Teatro RioMar.
Mundo
A inspiração do tema deste ano veio do ensaio clássico “A Era dos Extremos”, do inglês Eric Hobsbawn (1917-2012), um dos mais renomados historiadores do século XX, que traçou uma análise que vai da Primeira Guerra Mundial até a dissolução da União Soviética. De acordo com Francisco Cunha, o século XX foi um tempo de tensões e muita ruptura, mas que estamos vivendo, de fato, a era dos extremos agora. No mundo, um dos mais graves extremos é o de situações geopolíticas, com as atuais guerras da Ucrânia e da Palestina, e outras guerras e conflitos pelo mundo (como em Burkina Faso, no Sudão, em Mianmar, na Somália e no Iêmen).
Além da destruição das guerras, o homem também tem participação ativa nos extremos climáticos. Estamos vivendo o ano mais quente da história do planeta Terra. Francisco Cunha relembra o que já disse o secretário-Geral da ONU, Antonio Guterres: a era do aquecimento global acabou, mas a era da ebulição global chegou, com grandes enchentes, incêndios e um calor escaldante. O aumento da população mundial e o inchaço das cidades é um dos fatores que nos empurra para situações extremas. Há um inchaço ainda maior dos países mais populosos do mundo, com a Índia já ultrapassando a China em termos populacionais e se aproximando na questão de renda per capita.
Brasil
No território nacional, o destaque vai para os extremos políticos, ressaltando a posse de Lula em seu terceiro mandato e, poucos dias depois, a tentativa de golpe de estado no Brasil, colocando em risco a democracia. Outro ponto importante é a convulsão social que vivemos, com uma grave crise da segurança pública no País, com o crescimento exponencial do crime organizado, não apenas no Rio de Janeiro, mas em estados como Bahia, Rio Grande do Norte, e até em Pernambuco.
Em relação aos extremos climáticos no Brasil, os volumes de chuva registraram níveis nunca antes visto. De acordo com dados do Ministério de Desenvolvimento Regional, o aumento do número de desastres naturais no Brasil por ano saltou de 403 em 1991 para 4.749 desastres naturais em 2022. Os efeitos do El Nino também vêm causando mudanças grandes de temperatura e do volume de chuvas. A Amazônia vem enfrentando seca, o Pantanal sofrendo com incêndios, a região Sul padecendo com grandes enchentes. E temperaturas extremas em todo o país, com exemplo do Rio de Janeiro, que já enfrenta sensação térmica próxima de 60 graus. É urgente se debruçar realmente sobre o nosso papel ativo nisso tudo.
Na área da tecnologia, vivemos avanços de uma disrupção digital. Em 2023, o acesso à internet chegou a 84% da população brasileira. Entre 2020 e 2022, esse índice era 81%. Mas um ponto tem chamado atenção e precisa ser analisado pelo empresariado: os extremos alcançados pela inteligência artificial, fazendo refletir sobre funções exercidas por alguns profissionais em início de carreira, que correm o risco de serem substituídos pela capacidade de sistemas como o ChatGPT. Vamos perder para ele? Ou vamos aprender a utilizar a chamada inteligência artificial ao nosso favor?
Pernambuco
O Estado hoje tem carências físico-territoriais e sociais. Mais de 80% do território pernambucano está no Semiárido e isso nos traz um alerta em relação aos extremos climáticos que vivemos e a crise de água sem precedentes que podemos enfrentar. Na opinião de Francisco Cunha, falta capacidade de prospecção de futuro e de formulação de estratégias de longo prazo. Temas esses que Pernambuco se destacou no século 20, com a criação da Codepe (Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas) e as previsões do Padre Lebret, os dois precursores da Sudene.
Mas quais estratégias precisam existir? Uma gestão pública eficaz, dialogando com um empreendedorismo dinâmico e com a ciência, tecnologia e inovação, para que tenhamos uma educação de alta qualidade, uma infraestrutura adequada e uma sustentabilidade ambiental e climática, com a geração de mais energia limpa e mais barata para o desenvolvimento do Estado. Começando esse trabalho de reinvenção da capacidade pernambucana, ao chegar em 2037, quando Recife completa 500 anos, Pernambuco será mais próspero e com mais qualidade de vida e justiça social.
Recife
Os extremos discutidos em âmbito mundial, nacional e estadual pesam no município. Como um quebra-cabeça desmontado, é mais que urgente um planejamento de longo prazo para o Centro do Recife, com participação ativa do Recentro através do plano Rota do Futuro, para redesenhar a área central da cidade. O desafio dos bairros Santo Antônio, São José e Recife Antigo é fazer com que o problema da decadência e do esquecimento sejam combustível para a transformação.
Um grande destaque em andamento é o projeto Parque Capibaribe, desenvolvido através de um convênio entre a UFPE e UFRPE, produzindo o mais importante diagnóstico urbano e plano urbanístico da história do Recife. O projeto faz uma “recostura” do fragmentado território da cidade. Todo esse processo de reconstrução é primordial para chegarmos regenerados em 2037 – quando o Recife será a primeira capital brasileira a completar 500 anos.
Como superar a era dos extremos?
Além de todas as questões já discutidas acima para esferas políticas, empresariais e de gestão das cidades, Cunha ressalta que a necessidade de mudanças precisa partir também de cada indivíduo. A sociedade precisa voltar a discutir as mudanças que enfrentamos e o que precisa ser feito para sobrevivermos a tanto caos e extremos. Na opinião de Francisco Cunha, precisamos conhecer, gostar e realmente cuidar do lugar onde vivemos (seja o planeta, o país, o estado ou a cidade).
Como já disse o economista e fundador do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab, o Brasil pode ser uma potência ecológica, mas ainda tem obstáculos econômicos, como o baixo nível de investimentos. Para Francisco Cunha, podemos ser uma potência ambiental no mundo e temos como exercer esse papel no combate aos extremos climáticos.
Para isso, o consultor enumera atitudes que precisam ser abraçadas por cada um, como saber a sua contribuição individual para o aquecimento global, plantar árvores e defender as que já existem, engajar-se em movimentos de discussão do futuro sustentável de Pernambuco e jamais deixar alguém dizer que o Recife não tem jeito. Reflexões, discussões, elevação do nível de educação ambiental, tudo isso faz parte dessa mudança de mentalidade necessária.