Um alerta global sobre o impacto da inteligência artificial generativa no mercado criativo reacendeu o debate sobre a proteção de direitos autorais na era digital. Segundo o Relatório Anual de 2025 da Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores (CISAC), músicos e autores audiovisuais podem ter perdas de até 24% e 21% em seus ganhos, respectivamente, caso não haja uma regulamentação eficaz que garanta transparência no uso de obras protegidas, autorização prévia dos criadores e compensação justa. O estudo, divulgado em maio, evidencia o risco crescente de exploração de obras sem reconhecimento ou remuneração adequada em um ambiente cada vez mais automatizado.
A publicação internacional reforça uma preocupação que já se manifesta nos tribunais. No Brasil, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve recentemente a condenação da plataforma TikTok Music ao pagamento de indenização por violação dos direitos de um compositor, após a disponibilização de 46 músicas sem qualquer identificação de autoria. A Justiça reconheceu o dano moral e impôs o pagamento de R$ 30 mil, além da correção das informações. Para o relator do caso, o fato de a empresa se beneficiar economicamente das obras impõe o dever de verificar sua origem, conforme prevê a Lei de Direitos Autorais.
“As empresas que operam com conteúdo criativo precisam entender que não são apenas intermediárias neutras. Ao explorarem comercialmente músicas, vídeos ou outros produtos autorais, elas assumem responsabilidades que não podem ser delegadas apenas a terceiros, como a identificação e remuneração da autoria”, afirma a advogada Maria Wanick Sarinho, especialista em Propriedade Intelectual e integrante do escritório Escobar Advocacia.
Ela ressalta que a ausência de identificação de autoria não atinge apenas os criadores. “Há também um impacto direto no direito do consumidor à informação clara e adequada. Quando a autoria é omitida, o público é privado de saber a origem daquilo que consome, o que compromete a transparência e o respeito à diversidade cultural”, explica.
Para Maria Wanick, o crescimento da inteligência artificial amplia ainda mais os desafios. “Estamos diante de uma nova camada de complexidade. A IA não apenas consome obras existentes para gerar novos conteúdos, mas pode fazê-lo sem qualquer identificação ou retribuição ao criador original. Isso representa um risco real de apagamento autoral”, alerta.
Embora a internet e as tecnologias emergentes tenham democratizado o acesso à cultura, também escancaram fragilidades na proteção dos direitos autorais. Muitos artistas, especialmente os independentes, enfrentam dificuldades para garantir reconhecimento e remuneração em ambientes digitais. “É essencial que a legislação acompanhe essas transformações e que tanto plataformas quanto operadores de IA adotem medidas eficazes para evitar esse tipo de violação. Do contrário, o ambiente digital se tornará cada vez mais hostil à criação original”, conclui a advogada.