ARTIGO – Impossibilidade de reparação civil no dano ambiental por processo administrativo

by Redação

A responsabilidade por danos ambientais é tríplice e independente. Isto porque, o mesmo dano ambiental pode ensejar a responsabilidade do agente poluidor nas esferas cível, administrativa e penal, separadamente, conforme prevê a Constituição Federal no §3° de seu artigo 225.

Assim, enquanto independentes, as três responsabilidades possuem características distintas. A responsabilidade civil ambiental é objetiva à luz do §1° do art. 14 da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei n° 6.938/81), ou seja, a obrigação de reparar o dano independe da comprovação de intenção ou culpa do agente de causar os danos. Além da previsão legal, a natureza objetiva da responsabilidade civil ambiental é ponto pacífico no Superior Tribunal de Justiça, desde o julgamento dos Temas Repetitivos 681 (Recurso Especial n° 1354536/SE) e 707 (Recurso Especial 1374284/MG).

A seu turno, a responsabilidade penal ambiental possui natureza subjetiva, isto é, depende da comprovação de culpa ou dolo do agente, consubstanciados em negligência, imprudência, imperícia ou a intenção de causar o dano, de acordo com o art. 2° da Lei de Crimes Ambientais (Lei n° 9.605/1998). O mesmo ocorre em relação à responsabilidade administrativa ambiental que também segue a lógica subjetiva, conforme entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n° 1318051/RJ em 2019.

Cabe destacar uma outra distinção entre as esferas da responsabilidade por danos ambientais: a pretensão do Estado de reparação do dano ambiental na esfera cível é imprescritível, ou seja, inexiste prazo determinado para que o agente causador do dano ambiental possa vir a ser responsabilizado. O Supremo Tribunal Federal fixou esse entendimento por meio do julgamento do Tema 999 (Recurso Extraordinário 654.833 ACRE) da seguinte forma: É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental.

O mesmo não ocorre na esfera administrativa, na qual a pretensão para a reparação do dano ambiental prescreve em cinco anos a contar da prática do ato danoso, ou sendo este continuado em relação ao meio ambiente, a contar do dia em que tiver cessado.

Desse modo, conforme dispõe o art. 21, §1° e §2° do Decreto 6.514/2008, após os prazos acima destacados, a Administração Pública não possui mais o condão de buscar em sua esfera a reparação do dano ambiental ocorrido. Além disso, o mesmo artigo prevê no §4º que a prescrição da pretensão da Administração não impede a obrigação de reparar o dano na esfera cível.

Nesse sentido, percebe-se que as formas de reparação por dano ambiental nas esferas cível e administrativa são distintas e não se confundem. A esfera administrativa possui mecanismos próprios para chegar à reparação do dano ambiental seguindo a forma legal do processo administrativo e seus prazos prescricionais. Os processos administrativos tramitam em autarquias e agências ambientais, como, por exemplo, IBAMA e ICMbio ou a Agência Estadual de Meio Ambiente – CPRH, em Pernambuco. Estes mecanismos não se confundem com aqueles da esfera cível que ocorre por meio de ações judiciais próprias, podendo a reparação ser buscada a qualquer momento.

Assim, descabida é a pretensão que se tem observado em órgãos administrativos ambientais de buscarem a reparação civil no bojo dos processos administrativos. Na prática advocatícia, tem-se observado, por exemplo, cancelamentos de processos administrativos (iniciados por meio de autos de infração), com a consequente revogação das multas ambientais, mas a manutenção da penalidade de recomposição do dano, sob o argumento de que embora o auto de infração esteja revogado, mantém-se a penalidade em razão da imprescritibilidade da pretensão da reparação do dano ambiental.

Contudo, conforme destacado, a imprescritibilidade é inerente à responsabilidade civil ambiental, sendo indevida sua invocação no âmbito da responsabilidade administrativa ambiental, assim como é ilegal exigir o cumprimento de obrigação cível através de processo administrativo.

 

Fernanda Barreto Campello Walter é advogada e Bruna Lima é graduanda e estagiária de Direito (escritório Pires Advogados e Consultores)

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